Perdoe-me, Capitu!
- Maria Clara Castro
- Oct 15, 2020
- 3 min read
Updated: Oct 18, 2020

15 de outubro. Hoje é dia dos professores, uma profissão que tanto admiro.
Se analisarmos teoricamente a escola, esta é um espaço que adentramos com uma certa quantidade de conhecimento e saímos com uma quantidade maior ainda. Repito, teoricamente. O processo de aprendizado depende das diferentes circunstâncias, a realidade é múltipla, assim como as pessoas são únicas.
Contudo, o professor é o grande maestro de tal processo, ela abre as portas do conhecimento ao aluno, permitindo-lhes sair da caverna. Como muito bem escrito pelo professor de Relações Internacionais da PUC-SP Arthur Murta em um post no Instagram, “ser professor em 2020 é exercer uma das profissões mais difíceis durante o período pandêmico. [...] No modelo remoto, os professores estão cada vez mais sozinhos. A coletividade some, o debate é desestimulado, as inacreditáveis horas expostos a uma câmera e à tela de um computador trazem um nível de exaustão que não imaginava viver tão cedo”. E mesmo assim, felizmente, os professores continuam.
O texto de hoje tem a ver com desconstrução. Eu vejo o processo educacional como aquilo que possibilita o indivíduo se conhecer e repensar ideias e posturas. No meu primeiro ano do ensino médio, meu professor de redação propôs que escrevêssemos um texto relatando um momento de desconstrução que passamos/sofremos em um certo momento da vida. Basicamente, um eu pensava assim, aconteceu isso, agora penso desta forma. Escrevi sobre minha relação com a literatura. Eis o texto:
Jornal da hora do almoço. Eu e meus pais reunidos. Televisão ligada. Reportagem sobre o sertão nordestino retratado por Graciliano Ramos. Olhei de rabo de olho. Chato. Por que chamar um cachorro de Baleia? Que estupidez! Hoje em dia, lembro-me disso e reconheço que a estupidez era, na verdade, minha.
Antigamente, personagens em arenas, sociedades utópicas, mundos místicos me agradavam mais que os clássicos. Se isso é errado? Depende, tudo é relativo e tudo é muita coisa. Mas, profanar que são superiores aos clássicos, pelamor, a que ponto chegamos? Ou melhor, a que ponto cheguei?
Esta minha loucura, contudo, não pôde ser curada por Simão Bacamarte, mas sim pelos olhos de cigana, oblíqua e dissimulada de Capitu (que mulher!).
Quem diria, uma loucura salvou a outra! Bentinho me salvou. Entre os capítulos transbordados de Realismo, Dom Casmurro me trouxe à realidade, eu saí da caverna.
Olhos ofuscados pelo real, ou melhor, livro aberto com o dizer: “Capitu era Capitu, isto é, uma criatura mui particular, mais mulher que eu homem”. Neste momento, compreendi a essência da literatura brasileira. O viver num trapiche soteropolitano, a defesa de Nossa Senhora ao João Grilo, a antropomorfização da Baleia, a animalização de Fabiano e o olhar melancólico de Capitu ao defunto de Escobar, despertaram-me o amor aos clássicos e o reconhecer da limitação que eu tinha.
Perdoe-me Machado, Jorge Amado e todos os “ados” aos quais disse não. Agradeço-lhes por estarem em minha prateleira e fazerem parte de minha essência. Não sei o que faria sem vocês, talvez cometeria outra loucura. Quem sabe? O amanhã está por vir, talvez me surpreenda…, mas cometer um absurdo como fiz, jamais! Digo: perdoe-me, Capitu!
Se leu até aqui, agradeço e espero que tenha gostado. Eu, como neta de professores, entendo a importância e o quão complexa é a profissão, assim, gostaria de desejar feliz dia dos professores! Fica aqui o meu muito obrigada.
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